terça-feira, 10 de junho de 2014

O direito do terceiro mundo

Era primavera. Havia muitas árvores em Washington d.c. Isso foi algo que me surpreendeu nos Estados Unidos, eles têm mais árvores do que nós. Também tem mais asfalto, mas devo confessar que as árvores chamam mais atenção.
Eu estava aproveitando a cerveja. Como não podia beber no país, eu me certificava de aproveitar ao máximo toda a vez que podia tomar cerveja. No caso, era um almoço oferecido pela vizinha filipina da avó de uma amiga minha, que estava hospedando a mim e mais 6 estudantes para o Spring Break. Destes, só sua neta e mais uma garota eram estadunidenses (estadunidense sim, porque nada justifica negar nossa americanidade).
Eram duas mesas, uma composta só por jovens e outra com a avó da amiga, o marido da vizinha filipina que oferecia o almoço e uma grande amiga minha brasileira com uma cara de espanto. Eu já estava um pouco tonto por causa da cerveja que usava para empurrar a comida que tinha tanto carinho quanto faltava gosto. Naquele dia descobri que não sou chegado a cozinha filipina.
Quando eu sentei o senhor repetiu para mim o que tinha acabado de perguntar para minha amiga.
“Você acha justo esses imigrantes imundos virem aqui e usar o dinheiro dos meus impostos para a educação e a saúde dos filhos deles?”
Sim, todos os estadunidenses da casa eram republicanos. Aliás, o terreno em que estávamos pertencia (há muito tempo atrás) a fazendo do próprio George Washington. Aquele homem tinha servido alguma força armada dos EUA por muito tempo. Talvez tenha sido assim que houvesse conhecido sua gentil esposa filipina. A avó de minha amiga só concordava com tudo o que ele dizia. Eu não sei se eles não consideravam intercambistas imigrantes também ou era uma indireta de “caiam fora da minha casa”. Fico com a primeira opção.
O que estava diante de mim era o argumento mais ignorante e xenófobo contra a imigração de sul-americanos, centro-americanos e mexicanos nos Estados Unidos. A lembrança de que eu estava na casa dele sumiu. Também esqueci que o nome da cerveja que estávamos tomando era tão imigrante como os “mexicanos imundos” de quem ele não gostava. Sorri e respondi.
“Acho justo sim. Porque não é o seu dinheiro. Enquanto o senhor servia o exército, seu país ajudava a várias ditaduras serem implantadas nos países de origem desses “imigrantes”. Essas ditaduras favoreceram seu país economicamente, e muito! Meu país só se livrou de uma dívida daquela época há poucos anos atrás. Então, se eles e os pais deles é que trabalhavam para o lucro do seu país que pagava seu salário, oras, na verdade você deve muito a eles. E foram os seus pais que usaram os impostos deles para sua educação e saúde. Então sim, eu acho justo.”
Minha amiga deu um suspiro de alívio.  O senhor que já deve ter assassinado muitos durante sua vida começou a falar diretamente com nossa anfitriã sobre como “esses jovens de hoje em dia...” e eu continuei bebendo a cerveja com nome de imigrante ladrão com um grande sorriso no rosto.

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